Traduzido por Paulo Gomes. Texto original em ingles (21 de Dezembro de 2020): https://www.godforus.org/ramblings/learning-contentment-amid-another-lockdown/
Há nove meses atrás Ontario (uma das províncias do Canadá) entrou em lockdown. Desde então temos experimentado vários níveis de restrições relativas ao ajuntamento de pessoas, quer sejam públicos ou privados. Algumas dessas medidas foram muito sensatas, enquanto outras passaram longe de serem razoáveis. E agora estamos começando outro lockdown. Sim, o lockdown é somente temporário. Sim, a vacina contra o COVID está disponível. Sim, os comentaristas na TV indicam que teremos algum tipo de retorno à normalidade pelo verão canadense (entre os meses de Julho e Agosto). Sim, a situação poderia ser muito pior. Enquanto eu percebo isto, ainda vejo que sinto como se estivesse murmurando com a perspectiva de um outro lockdown.
Thomas Manton descreve o termo murmuração como “a escória ou o refugo do descontentamento.” De acordo com Jeremiah Burroughs, descontentamento é a falta de vontade de "submeter-se e deleitar-se com a vontade sábia e paternal de Deus, em todas as situações.” Colocando tudo junto, descobrimos o seguinte: a razão da nossa murmuração não é a pandemia, nem as restrições impostas pelos governos, e nem qualquer outra circunstância da vida. A causa da nossa murmuração não é o que acontece a nós ou ao nosso redor. A causa da murmuração é o que está se passando em nosso coração – nós murmuramos porque batalhamos contra o descontentamento, e lutamos contra o descontentamento porque recusamos nos submeter à vontade de Deus em cada circunstância da vida.
Tendo essa constatação em mente, tenho meditado nas palavras de Paulo em Filipenses 4:11, “porque aprendi a viver contente em toda e qualquer situação.” Eu quero ter condições de dizer o mesmo que Paulo. Desta forma, esta é a minha questão: Como podemos aprender a estar contentes (mesmo em meio a este lockdown)?
Antes de prosseguir quero deixar claro aquilo que eu não estou fazendo aqui neste artigo: não estou criticando as políticas governamentais a respeito do lockdown (ou mesmo a sua abordagem de maneira geral quanto a pandemia). Também não estou tratando os sérios problemas de longo prazo e dificuldades que um lockdown traz. Estes são assuntos importantes, e acredito que devemos pensar de maneira séria sobre eles. Mas não é isso que estou fazendo aqui neste artigo. Quero aqui considerar como eu (como um crente) posso “mortificar” a minha tendência a murmurar (reclamar, resmungar) quando as coisas ficam difíceis ou desagradáveis. Novamente, aqui está a minha questão: Como podemos aprender a estar contentes/satisfeitos (mesmo em meio a um lockdown)?
(1) Nós praticamos a gratidão
“Quanto ao mais, irmãos meus, alegrai-vos no Senhor” (Fp. 3:1).
Para que isso aconteça o evangelho deve estar ocupando o palco central de nossas vidas. Precisamos lembrar o amor de Deus ao prover o resgate do pecado e da morte eterna. Precisamos lembrar o que Cristo realizou na cruz do Calvário. Precisamos nos lembrar como Deus nos deu a fé salvífica em Cristo. Precisamos nos lembrar do dom que Deus tem nos dado através do Espírito Santo e de sua Palavra. Precisamos nos lembrar como Deus tem protegido e preservado a cada um de nós em situações que não foram nem perceptíveis a nós. Precisamos nos lembrar que Deus tem nos dado vida e respiração, comida e bebida, abrigo e provisão. Thomas Watson adverte: “Descontentamento é um pecado de ingratidão, porque nós temos muito mais misericórdias do que aflições.”
Se vamos aprender a ficar contentes, devemos, de forma consciente e consistente nos voltar para contar nossas bênçãos e praticar a gratidão.
(2) Nós cultivamos uma mente celestial
“Pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo” (Fp. 3:20).
Investimentos podem “evaporar,” casas podem desmoronar, os empregos podem desaparecer, os relacionamentos podem ficar amargos, e a saúde pode falhar. Mas a esperança é a expectativa confiante de glória baseada na imutável Palavra de Deus. “Mas, se esperamos o que não vemos, com paciência o aguardamos” (Rom. 8:25). A nossa esperança é firmada no retorno de Cristo, na ressurreição dos mortos, no final e total livramento do pecado, e na renovação total do cosmos. A esperança torna essa certeza futura uma realidade presente, e isso se torna uma luz que penetra nas sombras. É imune a todas as doenças, ameaças, dores, preocupações, desafios e perdas. Que perspectiva gloriosa! “Deus fará o mais fraco e sujo de nós tornar-se uma criatura deslumbrante, radiante e imortal, pulsando com tanta energia, alegria, sabedoria e amor como não podemos imaginar agora, um brilhante espelho sem nenhuma mancha e que reflete de volta a Deus perfeitamente (embora, é claro, em uma escala menor) o seu próprio poder ilimitado, deleite e bondade” (C. S. Lewis).
Se vamos aprender a estar contentes, devemos viver com a expectativa confiante de que o melhor ainda está por vir.
(3) Nós confiamos na providência de Deus
“Porque vos foi concedida a graça de padecerdes por Cristo e não somente de crerdes nele” (Fp. 1:29).
Este é um conceito muito difícil de entender: Deus “concedeu” aos primeiros crentes que eles deveriam “sofrer” por causa de Cristo. Deus realmente ordena nosso sofrimento? Sim. E ele promete operar “todas as coisas” (incluindo sofrimento) para nosso bem (Rom. 8:28). Por esta razão devemos “submeter-nos e deleitar-nos com a vontade sábia e paternal de Deus em todas as situações” (Jeremiah Burroughs). (1) Fazemos isso porque Ele é sábio (Jó 21:22). Sua sabedoria não é a nossa sabedoria, e Seus caminhos não são os nossos. Nosso conhecimento das coisas é severamente limitado, enquanto o conhecimento de Deus é absolutamente ilimitado. (2) Fazemos isso porque Ele é soberano (Jó 26:7–14). Ele não se perturba com o aparente caos no planeta terra. Ele não se inquieta, não entra em pânico e não se aflige. “Uma confusão selvagem pode reinar ao nosso redor, ainda assim os corações dos justos se alegram porque Deus não é - e não pode ser - destronado” (William Plumer). (3) Fazemos isso porque Ele se importa conosco. “Humilhai-vos, portanto, sob a poderosa mão de Deus, para que ele, em tempo oportuno, vos exalte, lançando sobre ele toda a vossa ansiedade, porque ele tem cuidado de vós” (1 Ped. 5:6-7).
Se alguma vez vamos aprender a ser contentes, devemos gravar/estampar profundamente a maravilha do cuidado providencial de Deus em nossos corações.
(4) Nós consideramos a Cristo como valioso
“Porquanto, para mim, o viver é Cristo, e o morrer é lucro” (Fp. 1:21).
Se dermos um valor desproporcional às coisas deste mundo, elas acabarão por capturar nosso coração. O problema é que eles não podem nos satisfazer porque não foram projetados para nos satisfazer. Como Jeremiah Burroughs escreve, “A razão de você não ter contentamento com as coisas deste mundo não é porque você não as tem o suficiente, mas porque elas não podem satisfazer sua alma imortal. Você é como um homem que tenta satisfazer sua fome abrindo a boca para engolir o vento. Ele acha que a razão de ainda estar com fome é porque ainda não engoliu vento suficiente.” Somente Cristo é de “valor incomparável” (Fp. 3:7–8). Ele é o maior bem, o amigo mais próximo, a mais rica graça, a maior honra, o melhor conforto, a mais fina beleza, a verdade mais profunda e o mais doce amor.
Se vamos aprender a estar contentes, devemos estimar todas as coisas em comparação ao valor inestimável de Cristo.
É isso que está em minha mente enquanto enfrentamos mais um lockdown – o que será algumas semanas longas, sombrias, e frias (lembro estamos no inverno canadense!). No final, oro para poder dizer junto com Paulo: “porque aprendi a viver contente em toda e qualquer situação” (Fp. 4:11).